Sorriso 159
- Panela?
- Não, uma caçarola. Panela é qualquer uma, né?
Ela disse e deu um sorriso esperto.
Moldava o barro e conversava comigo como se não prestasse atenção no que fazia. Mas estava ali, ligadíssima. Parecia poder fazer tudo aquilo de olhos fechados.
D.Isa, 64 anos de idade e fazendo aquilo há pelo menos 59. Antes era função da mãe, e antes da mãe, da avó e quem sabe onde isso começou.
- E nunca enjoou não?
- Não mesmo, uma peça nunca é igual a outra, nem o barro, nem a forma que fica...
Ela lançou aquele olhar esperto mais uma vez e convidou.
- Repara...
E fiquei ali namorando as panelas, de diversos tamanhos, ranhuras e texturas diferentes. De fato nenhuma era sequer semelhante.
Pensei no amor que a gente tem que ter naquilo que faz e como é bom quando temos um trabalho que quase não é trabalho, no sentido de acordar e pensar "que bom, vou trabalhar".
Outro dia me perguntaram: o que você mudaria em sua vida se pudesse?
Se eu mudasse moldaria minhas panelinhas do mesmo jeito? Afinal, foram os acertos, as burradas, as escolhas, as armadilhas, os encontros e as roubadas que fizeram com que eu tivesse a mão que tenho hoje.
Boa ou torta, é a mão que tenho. E com ela vou amassando meu barro e construindo minhas coisas.
Que nem a D. Isa. Não sei se com um sorriso tão confiante.
Mas um dia eu chegou lá.
E acabei de ganhar um ano novo em folha para moldar ainda mais coisas.
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