Sorriso 183

Juan estava bolado com aquela movimentação no quintal da vizinha dele. E eu bolado com o cabelo do Juan.
Provoquei.
- Você tem quantos anos? Uns sessenta né?
Juan me olha de lado e manda um sorriso de “tô nem aí”.  Eu continuava mentalmente procurando o melhor quadro pra fazer a entrevista e Juan adentrou pela minha cabeça.
- Isso vai passar na TV?
Respondo que sim. Ele continua a olhar a movimentação.
- Quando?
Disse que não sabia.
- Como assim não sabe?
Abusado como todo Juan. Tenho um desses.
Prossigo a provocação.
- Quem é loiro assim na sua família? Seu pai ou sua mãe?
Eis que pelo portão, curioso com os cabos, refletores e aquele povo espaçoso surge outro igual ao Juan. Mesma cara, corpo, cabelo, só que menor.
Continuei implicando com o loirinho.
- Teu filho, Juan?
Outro menino, Gabriel, se aproxima e me explica.
- Não, é irmão dele, Lucas...  E ele é dançarino...
Eu tinha que ver aquilo. Alguns pedidos, um pouco de falsa modéstia e o moleque começa a executar, com seu gingado de uns seis ou sete anos, vários passos do “passinho”. Uma delícia de se ver.
- Juan, Lucas, bora que a mãe tá chamando...
No portão estava em pé uma versão maior de Juan, com os mesmos cabelos descoloridos. Talvez uns quinze anos, aquela voz mudando, um ar marrento.
Os dois se aboletaram na bicicleta do mais velho e ainda os vi se afastando rua acima. Juan ainda me sorriu de lado, com essa cara da foto.
Gabriel parou ao meu lado e lamentou estar fora da moda enquanto passava as mãos nos cabelos castanhos.
- Minha mãe não deixou.
Daqui a uns anos, revendo suas fotos, você vai agradecer a ela Gabriel.